A produção artística do artista carioca Fábio Carvalho é resultado de uma reflexão sobre os elementos que constituem as expectativas e as representações do gênero masculino. Sua poética artística opera na superposição e no conflito entre signos aceitos por grande parte da sociedade de uma forma dicotômica: masculinos e viris de um lado, versus femininos do outro, delicado e sensível, em particular os padrões florais, as borboletas, a louça de porcelana, o bordado, as rendas, entre outras práticas normalmente consideradas femininas.
As imagens usadas em seus trabalhos, via de regra, são apropriações de publicações/objetos pré-existentes, uma vez que são estas as imagens usadas para a construção do discurso hegemônico da masculinidade tóxica, que já estão no imaginário de todos, e por isto, entram nos trabalhos para serem questionadas e problematizadas.
Inicialmente os trabalhos do artista giravam em torno de como desde a infância, mesmo que não intencionalmente, os padrões de comportamento tidos como “corretos” para cada gênero são ensinados através dos brinquedos e brincadeiras permitidas ou encorajadas para cada sexo, que desde muito cedo moldam uma divisão em dois blocos bem nítidos do que é aceito como “masculino” e “feminino”. Depois de explorar o território da infância, Fábio Carvalho seguiu para o mundo adulto, onde os estereótipos de virilidade estão já bem consolidados: o militar/policial, o halterofilista, o operário braçal, o cowboy e o super-herói viril.
Viver e crescer em uma sociedade “macho” e sexista é algo muito complicado, especialmente para quem foi criança no Brasil dos anos 1970. Mesmo nas famílias que não eram muito retrógradas, os fortes papéis estereotipados do masculino/feminino sempre estavam presentes, fazendo com que fossem introjetados como “verdade”. Tanto antes, como ainda hoje, um menino acaba sendo direcionado para determinados padrões de comportamento esperados. Agora... e se o menino gostar de brincar de casinha, ter e cuidar de plantas, tocar piano, dançar e cantar como nos antigos musicais, ao invés de jogar bola com os outros? Acho que todos sabemos a resposta.
Vivemos tempos conturbados e retrógrados, onde a perseguição e censura aos comportamentos tidos como desviantes de um certo padrão conservador – aquele que cumpre com os estereótipos impostos por uma parcela antiquada de nossa sociedade, da “moral e bons costumes” – avança em marcha assustadora. Portanto, o artista entende como de grande importância, com sua produção artística, levantar um debate sobre questões de gênero, afetividade e sexualidade, e assim provocar a tradição ocidental patriarcal, e sua arraigada ideia de que há limites para o que constitui o gênero masculino.
Em seus trabalhos, Fábio Carvalho procura apontar as fragilidades ocultas por trás da máscara de homem viril bruto, e fazer pensar sobre como ao homem não é permitido um espaço onde ele possa dar vazão às suas vulnerabilidades, sendo obrigado a ser sempre forte, viril, imbatível, vitorioso. Visa ainda questionar estereótipos de masculinidade e a noção geral de que força e delicadeza, virilidade e poesia, vulnerabilidade e valentia são qualidades humanas impossíveis de existir lado a lado. Com sua produção, quer lembrar que não existe uma forma “correta” de ser homem, que na diversidade e variedade de comportamento, gosto, atitude, há muito mais força e riqueza do que na monotonia de um único padrão. |